Susana Silveira e a Cigana Sem Tabu
Susana Silveira, uma jovem de 33 anos, cigana, divorciada e Mãe de duas crianças. Esta mulher é uma ativista cigana pelos direitos humanos, sendo uma das fundadoras da Associação Costume Colassal, que tem como objetivo a integração das comunidades ciganas na sociedade, e também se integra num grupo de consultores ACM associado ás emigrações que se chama Consigo e sendo um membro consultivo da União Europeia; além disso desenvolve trabalhos comunitários a nível local na zona que reside e criou um projeto através do Portugal 2020 que se chama Criando Raízes.
Desta forma, estes trabalhos destas associações que Susana faz parte e dedica a parte do seu tempo em que tem um trabalho exemplar no futuro desta comunidade e a sua luta é promover a educação, desconstruir qualquer tipo de preconceitos ou rótulos e disseminar toda a descriminação e racismo. A Criando Raízes oferece formação na área do empreendedorismo, na área da habitação, emprego e igualdade de género para uma adaptação e aproximação da comunidade cigana na sociedade maioritária.
Susana apesar de divorciada é independente, é uma mulher que preza muito a cultura e costumes da comunidade cigana, neste momento quer concluir os estudos referindo que é um incentivo para os filhos estudarem.
Embora se cassasse aos 17 anos, esteve casada 13 anos e namorou 3 meses e quando casou pensou que fosse um casamento para a vida, mas hoje é uma mulher bem resolvida e pronta para amar novamente e diz que é uma mulher feliz e realizada.
Na entrevista ao Love with Pepper, esta mulher conta-nos como é desafiante viver dentro da Comunidade Cigana e nas adversidades que esta tem tido ao longo da sua vida.
Como define o seu percurso de vida com 33 anos?
Como mulher cigana sempre fui privilegiada dentro da comunidade, a minha família embora tradicional era uma família com alguma estabilidade financeira o que fez com nada me faltasse e por isso sempre me considerei uma mulher feliz e realizada, mas a minha caminhada continua a ser feita com os objetivos que pretendo aprender e a evoluir cada vez mais e após a separação estou a construir-me e a conhecer-me melhor.
O que é ser mulher cigana?
É uma mulher cuidadora, corajosa, empreendedora, mas acima de tudo é protetora, é Mãe.
Qual a essência da mulher cigana?
A nossa essência é muito cuidar da família, mas a alegria, a energia, a festa considero que faça parte da alma da mulher cigana.
Considera que o fato de ser mulher cigana lhe afetou nas suas relações pessoais e amorosas?
Nunca tive essa perceção, porque sempre convivi e sempre fui sociável com todo o tipo de pessoas.
Alguma vez se apaixonou por alguém fora da comunidade?
Não, porque nunca me identifiquei com homens da sociedade maioritária e considero que os homens são bem mais bonitos e charmosos! (risos)
O que entende por sexualidade?
Na comunidade sexualidade é todo um conjunto, envolve o casamento, o constituir família, o incutir de valores aos nossos filhos que ainda são criados e educados de uma forma muito conservadora; ainda há um caminho a ser feito.
Como é vivenciar a sexualidade na cultura cigana?
Normalmente, na nossa cultura as meninas casam-se muito cedo, sendo propositadamente para elas sejam resguardadas em relação á sua virgindade, para que possam ter um parceiro e constituir família e seja para a vida. De modo que, o assunto sexualidade ainda é muito tabu dentro das famílias, ainda não existe abertura e eu também admito que não tenho essa abertura com os meus filhos.
Como se vive a sexualidade antes do casamento?
Não se vive. Como tradição e costume no casamento a mulher tem que se ir virgem para este.
Na sua opinião, como vê o casamento, em que existe a escolha do marido por parte dos pais e muitas dessas mulheres são ainda menores acha a comunidade foi quebrando esse costume?
Na tradição cigana não existe casamentos forçados é contra a nossa lei, mas pode haver quem o faça. Quando uma menor casa é de livre e espontânea vontade dela e da família, mas isso faz não parte da cultura.
Quem escolheu o seu ex marido?
Fui eu e conhecemo-nos através de familiares em comum e foi um casamento por amor.
Foi virgem para o casamento?
Sim, fui.
Vai incutir ou preservar o valor da virgindade aos seus filhos?
Sim, acho um valor muito bonito e que deve ser preservado e ficaria muito feliz se o fizessem.
Dentro da comunidade como é vista a mulher cigana divorciada?
É vista como uma mulher frágil.
Sendo a Susana divorciada como foi o seu processo dentro da comunidade?
Não foi fácil. Embora como mulher nunca gostei de expor a minha vida, sempre fui independente e tive o apoio da minha família, isso foi o mais importante.
É possível voltar a amar e casar novamente?
Claro que sim, mas tudo isto que gira à minha volta é muito recente.
A mulher cigana sexualmente consegue libertar-se no casamento ou sente algum freio por parte do homem cigano?
Embora isso seja uma questão muito individual, acho que na maioria das vezes a mulher cigana conhece e casa com aquele homem e vai descobrindo e aprendendo com o seu parceiro e vivam uma sexualidade prazerosa.
Considera que as relações sexuais devem ser héteros ou aceita outras orientações?
Esta questão tem a ver com a religião, porque a maioria da comunidade é evangélica, ou seja, segundo os seus ideais Deus criou o homem para a mulher e vice-versa talvez venha daí essa resistência ao assunto homossexualidade, mas ainda é um tema que tem que ser trabalhado e muito falado.
Se fosse Mãe de um filho/a homossexual como reagiria?
Em primeiro lugar tentava falar, compreender e perceber, mas tinha que aceitar porque os meus filhos são um pedaço de mim. Como defensora dos direitos humanos as pessoas têm liberdade de escolha e amar livremente.
Acha que existe ainda muita violência doméstica e sexual na comunidade em relação a mulher dentro do casamento?
Infelizmente sim. Embora considere que a violência doméstica faça parte de toda a sociedade e não se foge dela, mas acredito que cada vez mais estamos no bom caminho, porque o homem cigano, hoje em dia, tem prazer em mostrar que a sua esposa é bem tratada, cuidada e também se vê etnia jovem cigana a viajarem muito o que não acontecia há alguns atrás. Quanto à violência sexual a partir do momento que a mulher concorde ter o ato e o marido faz com que tenha, isso para mim já é violência sexual física e psicológica. A comunidade não vê com bons olhos qualquer tipo de violência e há sempre as pessoas mais velhas a interferir para o bem do casal.
Como vê segundo a lei cigana, o papel secundário da mulher?
Para mim o papel da mulher dentro da comunidade é primário, pois é ela que comanda tudo na família no caso de tratar, cuidar e prezar muito esta.
Como se vive o luto na comunidade?
Normalmente, quando perdemos um ente querido na família é muito triste e doloroso, mas este costume do luto nós povo adquirimos pela tradição portuguesa. No caso de ficar viúvo(a) com mais idade, por norma tenta-se esconder a beleza da pessoa, na mulher ela corta o cabelo (este que vai junto no caixão com o esposo) e veste-se toda de preto, no homem veste-se sempre de preto e anda de chapéu e deixa crescer barba e ambos não podem voltar a casar, é um luto para a vida, tal acontece quando se perde um filho. Hoje em dia, os viúvos(as) mais jovens podem voltar a casar e refazer a vida.
É possível viver uma vida sexual saudável e prazerosa e ter uma sexualidade saudável de acordo com as normas e regras da cultura cigana?
Claro que sim, dentro do casamento.
Acha que o tema sexualidade tem evoluído dentro da comunidade cigana ou ainda é um tabu?
Embora seja um assunto tabu, nós comunidade temos que deixar o preconceito de lado e estarmos abertos a novas mentalidades. Contudo o caminho está a ser bem feito inclusive na área da educação sexual nas nossas escolas e nas nossas associações e acho muito importante nestes jovens que nos irão representar no futuro.
O amor vence o preconceito?
Tem que vencer, porque nós seres humanos temos que nos respeitar, quebrar o preconceito, racismo que está incutido numa mentalidade retrógrada e que não impedirá a nossa felicidade. O Amor pode tudo e vence, mas é preciso ser corajosa para enfrentar as tais adversidades e pedras que possam aparecer no nosso caminho.
Susana SiIveira, Fundadora da Associação Costume Colassal
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