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Susana da Fonseca, MulherEndo - Associação Portuguesa de Apoio a Mulheres com Endometriose



1 de Março de 2023, Dia Nacional da Endometriose e Adenomiose


Susana da Fonseca, uma jovem de 38 anos, mestre em Psicologia Clínica, assume um dos desafios mais importantes da sua vida o de Presidente da Associação de Apoio a Mulheres com Endometriose.


Quando foi diagnosticada aos 21 anos com endometriose, começou a sua luta pela sensibilização e consciencialização sobre esta doença.


Nessa altura considerou que devia fazer algo pelas mulheres que estariam a passar pelo mesmo que ela estava a passar e decidiu então criar a Associação Portuguesa de Apoio a Mulheres com Endometriose. Hoje, é uma mulher mais resiliente e vê que a endometriose a tornou uma mulher mais forte e com uma maior capacidade de superar e ultrapassar os problemas que esta doença lhe trouxe.


Na entrevista ao Love with Pepper, Susana fala-nos abertamente como é viver em Portugal com uma doença crónica como a Endometriose e dos desafios que esta patologia lhe trouxe para a sua vida.


Como define o seu percurso de vida com 38 anos?


A endometriose definiu o meu percurso, tornando-o um bocadinho atribulado. Desde que comecei com os sintomas mais incapacitantes, pelos 14 anos, sinto que estes definiram muito a minha vida. Tinha um projeto enquanto professora e tive que desistir dele porque o início da minha carreira nessa área coincidiu com o diagnóstico e com a fase mais aguda da endometriose. Nessa altura não tinha condições físicas nem psicológicas para continuar com aquele trabalho. Por tudo isto, diria mesmo que esta doença ditou e definiu muito o meu percurso de vida.



Como nasceu a Associação Portuguesa de Apoio a Mulheres com Endometriose?


Começou a nascer precisamente no dia em que tive o meu diagnóstico. Nesse dia criei um blog para partilhar a minha experiência com outras mulheres e, com o passar do tempo, fui conhecendo várias mulheres na mesma situação. Nessa altura não existia nenhuma associação ligada a esta patologia pelo que fazia todo o sentido formar uma. Basicamente, nasceu de um projeto pessoal que se foi alargando e ao qual se foram juntando outras pessoas.


Como é ter um papel de tanta responsabilidade como Presidente desta associação tão importante para as mulheres?


É um papel de muita responsabilidade, mas também muito gratificante, porque na verdade esta associação muda vidas. Acompanhamos estas mulheres para alcançarem um diagnóstico ou obterem um tratamento adequado e muitas delas recuperam muita qualidade de vida.


Qual a missão desta associação?


A missão desta associação é ajudar o maior número possível de mulheres e fazer a consciencialização sobre esta doença na sociedade. A endometriose é a maior causa de infertilidade feminina, embora a doença não seja sinónimo de infertilidade. Muitas mulheres não estão devidamente acompanhadas e nós, na associação, tentamos orientá-las para o sítio certo e para os profissionais mais adequados. Neste momento a associação tem vários projetos a decorrer, temos por exemplo uma equipa de formadoras certificadas que realizam sessões de esclarecimento em escolas por todo o país com o objetivo de sensibilizar os jovens para a existência da doença e os seus sintomas, tentando também eliminar o mito de que a dor menstrual é normal.


Para si o que é a endometriose?


Costumo dizer que a endometriose é uma erva daninha que me acompanha sempre. Por mais que nós a tratemos, por mais coisas que façamos para a controlar, quando pensamos que está tudo bem, ela arranja sempre forma de aparecer. Infelizmente esta tem sido a minha realidade.


Com que idade surgiu a endometriose?


Os sintomas começaram aos 11 anos com a primeira menstruação, tendo se intensificado pelos 14 anos, mas apenas obtive o diagnóstico aos 21 anos.


Quais foram os seus sintomas?


O meu primeiro sintoma foi dismenorreia (dor menstrual) que se foi intensificando de ano para ano. Ia com frequência à urgência hospitalar levar medicação endovenosa porque a medicação oral já não era suficiente para controlar os sintomas. Tive problemas intestinais graves, cólicas fortes, quadros de obstipação e diarreia. Às vezes tudo no mesmo dia. Para além disso, tinha infeções urinárias de repetição, que na verdade eram falsas infeções, uma vez que tinha todos os sintomas, mas na urocultura não havia presença de bactéria, e também dor na relação sexual, entre outros sintomas. Felizmente o meu quadro melhorou após a primeira cirurgia.


Como chegou a um diagnóstico?


Depois de várias idas a urgências hospitalares, de exames inconclusivos e de consultar cerca de 7 ginecologistas, que desvalorizaram os meus sintomas, recorri a um profissional que ouviu todas as minhas queixas e com a observação clínica chegou ao diagnóstico da endometriose. Diagnóstico esse que depois foi confirmado por diversos exames, como ecografia transvaginal, ressonância magnética, colonoscopia, clister opaco e análises clínicas. Após estes exames foi possível verificar que tinha órgãos a ser afetados e que estavam em risco, nomeadamente o intestino, tendo sido posteriormente cirurgicamente intervencionada.


Quando lhe falaram pela 1ª vez de endometriose sabia o que era?


Sim, porque depois de muitos anos de sofrimento e de muitas pesquisas acabei por fazer um autodiagnóstico e foi isso que me levou ao médico especialista nesta doença.

Nesse dia fiquei feliz porque felizmente um especialista confirmou o que eu já desconfiava e a partir daí seria possível traçar plano de tratamento. Qual o seu tipo de endometriose?


Endometriose profunda grave. E, antes da histerectomia, tinha também adenomiose difusa. Qual foi o seu maior receio nesta doença?


Inicialmente era o de não conseguir engravidar e levar uma gravidez até ao final. Depois de ser mãe, os receios mudam, e comecei a ter medo das cirurgias. Existe sempre o medo de algo correr mal e não voltar a casa…


De que forma é que esta patologia lhe alterou a sua sexualidade a nível de desejo e libido?


Até entrar na menopausa tinha dificuldades em ter relações sexuais, devido às dores. Como tinha adenomiose difusa e um tumor no septo recto-vaginal tinha dor na penetração. Como entrei na menopausa cirúrgica aos 32 anos, comecei a ter os sintomas típicos da menopausa, como perda de libido e secura vaginal. É necessário adaptar os cuidados a cada fase da nossa vida e quando estes sintomas surgem pode ser benéfico o uso de hidratantes vulvares e vaginais, assim como recorrer à fisioterapia do pavimento pélvico. Sendo que, é de extrema importância existir uma compreensão muito grande por parte do companheiro.


Acha que a endometriose interfere na lubrificação, excitação da mulher?


Considero que sim, em muitos casos! Quando existe endometriose na zona do septo reto-vaginal é possível que a penetração cause dor nessa zona. Da mesma forma que, caso exista adenomiose, quando a penetração é profunda, o pénis ao tocar no colo do útero vai provocar dor. Quando este quadro se repete pode, posteriormente, ocorrer uma antecipação da dor. Ao saber que a dor vai acontecer a mulher pode perder a líbido e o desejo sexual. Já para não falar que alguma medicação hormonal pode também interferir na líbido.


Como classifica as suas dores menstruais?


As minhas dores, numa escala de 0 a 10, eram 15. Eram dores mesmo incapacitantes. Neste momento, e tendo em conta as cirurgias que já realizei e todos os restantes tratamentos, o quadro de dor mantém-se controlado na maior parte dos dias.


Qual foi o tratamento que fez?


Até ao momento já fui submetida a três cirurgias para excisão da doença, sendo que uma delas incluiu uma histerectomia total. Além disso, fiz terapêutica hormonal, medicação analgésica, fisioterapia do pavimento pélvico, entre outras terapias complementares. É Mãe, quando engravidou recorreu a algum tratamento de fertilidade?


Não, engravidei de forma natural, após a primeira cirurgia.



Como foi receber a notícia que estava grávida, quando se sabe que a endometriose é uma patologia que interfere na infertilidade da mulher?


Foi uma gravidez muito planeada, programada e desejada, porque tinha um período máximo para poder tentar engravidar de forma natural.

Depois de vários testes negativos, veio um positivo, mas só acreditei que era real na primeira ecografia, quando ouvi o coração a bater. Foi uma gravidez de risco?


Sim! O início da gravidez foi tranquilo, mas depois necessitei de repouso absoluto. Como tinha adenomiose, o meu útero estava em constante contração ao mínimo esforço que fazia.

Consegui aguentar a minha gravidez até às 37 semanas e 2 dias e felizmente correu tudo bem. Quantas cirurgias fez devido a esta doença?


Foram 3 cirurgias. Com que idade removeu o sistema reprodutor?


Removi aos 32 anos. Sente-se uma mulher segura a nível sexual?


Sim, porque tenho um ótimo companheiro, mas para isso tem que existir compreensão e muito diálogo. Acho que é de extrema importância que o companheiro conheça a doença e perceba que as limitações físicas que ela provoca são reais. Como lida com uma doença crónica?


Neste momento lido bem, porque felizmente consegui transformar o negativo da minha vida em algo positivo. Como é óbvio, em alguns momentos, também me vou abaixo e nesta última cirurgia aconteceu isso. Mas faz parte do processo de aceitação e da vivência diária com esta doença.

Sexualmente realizado. Vida feliz. É o lema do Love with Pepper, concorda?


Sim, concordo, em parte! Acho que ninguém deve reduzir a sua felicidade apenas a um aspeto da sua vida. Quando se tem Endometriose aprendemos a valorizar as pequenas coisas e é importante perceber que a felicidade na questão da intimidade não passa apenas pela relação sexual com penetração. O sexo é bom?


É suposto ser! Quando existe dor associada é importante averiguar a origem do problema e encontrar uma solução adequada!


Susana da Fonseca, Presidente da Associação Portuguesa de Apoio a Mulheres com Endometriose


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