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Os dias da mulher pelo olhar deste homem



Pedir a um homem que escreva sobre o dia internacional da mulher é sempre um risco. Mais ainda num espaço dedicado à sexualidade. Aqui estou a colocar o meu pescoço no cepo.


Parece-me consensual a ideia de que as mulheres têm vindo a conquistar o espaço público, mas que isso não as livrou da quase exclusividade do trabalho doméstico e dos cuidados aos filhos.

Visto que a pressão social nos empurra a todos para corresponder às diversas exigências da vida com a máxima eficácia, muitas destas mulheres sentiram que deviam viver numa obrigação constante para fazerem o pleno: (super)competência no trabalho, a fada do lar e a mulher/amante sexy, dentro e fora de casa.

E fazem-no num clima de desigualdade em relação aos homens.

Com as mesmas, ou mais, habilitações do que eles, ganham menos para trabalhos equivalentes e têm um acréscimo de cerca de mais 6 horas/dia de trabalho não pago (dizem alguns estudos que serão precisas 5 ou 6 gerações para uma distribuição equilibrada das tarefas domésticas).


Exausta, infeliz no trabalho, mal paga, muitas vezes, desapoiada e desvalorizada pelo companheiro, ainda assim, espera-se (exige-se?!) que a mulher esteja disponível para o amor e o sexo.


Mas elas lutam.

E graças a essa luta, o papel da mulher no amor e no sexo está a mudar.

Elas têm vindo a deixar o lugar exclusivo de objeto de desejo e passaram a ocupar também o lugar de sujeito de desejo. Temos agora relações mais equitativas – ainda não igualitárias - e mais exigentes para eles. A partir do momento em que temos dois sujeitos desejados e desejantes, a masculinidade deixou de valer de per se.

Agora é preciso estar atento aos ritmos, desejos e necessidades delas.

Deixou de ser o sexo de sentido único, assente num poder patriarcal que não se questionava. Não me parece muito arriscado afirmar que hoje o sexo é maior fonte de prazer para as mulheres do que era no passado.


Apesar de eu achar que o registo de mulheres e homens se tem vindo a aproximar, parece-me que elas continuam a ter uma visão menos quantitativa e mecanizada do sexo, e a obsessão com a performance é, muitas vezes, sentida como a sua coisificação e não como uma genuína preocupação com os seus desejos.

Também no sexo puro e duro os registos se têm vindo a aproximar.

Hoje as mulheres falam de sexo ocasional, até do sexo conquistador - procura da quantidade e da diversidade, por diversão ou por necessidade de reforço narcísico -, com muito menos culpa ou vergonha do que acontecia no passado.


Eu não perdi totalmente o juízo, o duplo padrão tem-se atenuado, mas não desapareceu.

Elas ainda têm uma gestão da sua “boa reputação” muito mais apertada do que eles. Por isso se diz, acerca do sexo, que eles mentem sempre para mais e elas para menos.


Talvez ajudasse se nos esforçássemos por acabar uma visão sexista das pessoas.

O essencialismo atribui qualidades e defeitos inerentes ao género que nos afastam da realidade. Frases como “as mulheres são mais delicadas”, “trair é da natureza masculina”, são desmentidas diariamente e resvalam para paternalismos como “atrás de um grande homem há sempre uma grande mulher”.

São muitos séculos de um caldo cultural a dizer-nos que o homem possui e a mulher entrega-se, eles são ativos e elas passivas.


A verdade é que a realidade está em constante mudança. As mulheres têm hoje mais relações pré-nupciais, podem ter diferentes configurações de relações amorosas e são-lhes aceites outro tipo de atrevimentos e de “falhas reputacionais”. Elas estão cada vez mais longe da imagem da mulher ingénua e passiva. Estou a um passo de decretar que a mulher leviana está em vias de extinção, mas acho melhor refrear o otimismo exagerado e dizer, apenas, que esse conceito tem vindo a ser redefinido.


A menor repressão social sobre a mulher trouxe também um paradoxo: “se a felicidade amorosa e sexual está agora acessível a todas, então, sou culpada por não estar tão realizada como deveria”. Não é bem assim. O amor e o acaso têm leis que escapam ao controlo omnipotente. Ser escolhido ou rejeitado, competição e rivalidade, sucesso e fracasso, além dos conflitos internos que cada um de nós carrega, são variáveis de um mercado pouco regulado.


A igualdade de género é um direito que, como outros direitos, pode ser exercido ou não, mas deve ser garantido. É de direitos humanos, de saúde e de alegria de viver que estamos a falar. Quanto maior a desigualdade de género, maior a castração feminina.

A luta pela igualdade continua e há homens nas fileiras.


Aquilo que este homem gostava mesmo era que estivéssemos a celebrar o “dia em que deixou de ser preciso celebrar o dia internacional da mulher”.



Dr. Pedro Fernandes, Psicólogo Clinico e Psicoterapeuta



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