Os desafios da mulher cigana: sexualidade!
“Ser cigano é está pronto a aprender. Mas jamais esquecer o que aprendeu no passado. É respeitar a opinião de todos. Mas guardar os conselhos e preceitos dos mais velhos. E ser livre de pensamento. Mas preso em sua cultura. É amar a si e ao próximo. Mas jamais esquecer que quem sustenta a todos... A mãe natureza”
Provérbio Cigano
Os desafios da mulher cigana: sexualidade!
Desejo abordar algumas especificidades étnicas da população cigana na temática da sexualidade, abraçando o convite que me foi dirigido.
Não é apenas biologicamente que somos sexuados, uma vez que toda a nossa organização social e cultural é, também, sexuada, e daí as diferenças de cultura para cultura.
Regista-se, em todas as culturas, um duplo padrão sexual que, tradicionalmente, restringe a excitação e o comportamento sexual da mulher, enquanto encoraja o do homem. Decorrente deste duplo padrão sexual, as proibições sociais contra a nudez em público pretendem reduzir os estímulos desencadeantes de excitação sexual em público, considerada perigosa para a moral e ordem social, que recai, sobretudo, sobre as mulheres.
Mas, antes de tudo, quem são as mulheres ciganas?
A mulher cigana na generalidade casa-se cedo, normalmente antes dos 20 anos, e os filhos são uma constante, porque o valor da família, está muito presente nesta cultura. Os casamentos na generalidade ainda são combinados, mas já há mais abertura para ouvir e dar voz ao futuro casal. Contudo, a mulher, continua a apresentar um papel de maior dependência e de menor escolha face ao homem/marido, em todos os campos e mesmo no campo sexual. Apesar de já se encontrarem ciganas com formação educativa, acho que ainda há muito a fazer neste âmbito, e que é fundamental para a sua liberdade a todos os níveis de vivência. Porque existem coisas simples e pragmáticas, pois veem muitas vezes os seus direitos a serem violados, por simplesmente não saberem ler.
Mas, em Portugal, atualmente, as mulheres ciganas adquiriram um progressivo protagonismo no seio da sua comunidade e em alguns espaços da vida pública, verificando-se cada vez mais que as mulheres não se centram exclusivamente nas tarefas domésticas, mas também desenvolvem atividades no mercado de trabalho e frequentam cursos de formação profissional. Contudo, ainda persistem muitas diferenças que também se refletem na sua vida sexual.
As mulheres ciganas estão sujeitas a múltiplas formas de discriminação ligadas à sua condição de mulheres e de ciganas. A discriminação contra os ciganos tem tido como efeito, não só, situações de pobreza, mas também a alienação e exclusão. Para as mulheres ciganas a discriminação múltipla traduz-se, entre outras, em altas taxas de analfabetismo, poucas oportunidades de emprego, má saúde física e psicológica, e vulnerabilidade à violência doméstica.
Continua a existir uma sobre proteção das meninas: desde cedo que as meninas são preparadas para o matrimónio e para assumir as funções reprodutivas. O sexo aparece como um elemento tabu, o que é um aspeto a ter em conta em tudo o que esteja relacionado com a educação sexual, o planeamento familiar e a prevenção de doenças ginecológicas.
A lei costumeira tradicional dos ciganos não reconhece a igualdade entre os dois sexos. O número de filhos não é decidido pelas mulheres, depende antes da tradição e do grau de integração social. Para a maior parte da comunidade cigana a honra da família é a coisa mais importante, e a castidade e a pureza das mulheres é fundamental para essa honra. A opinião dos membros da comunidade é uma parte muito importante da vida dos ciganos. Para manter uma boa imagem pública, os pais ciganos exercem um controlo rigoroso sobre as meninas da família desde tenra idade.
Acresce, que como a cultura cigana é bastante permissiva ao homem, existem muitas mulheres a serem infetadas com doenças sexualmente transmissíveis sem saberem, e sem que exista qualquer recriminação para o homem. A contraceção é uma prática pouco comum, embora comece a ser mais frequente nas mulheres mais jovens.
O mundo cigano é um universo com muitas facetas, onde a tradição e a modernidade se cruzam, e que só o tempo dirá como pode evoluir.
Mas, eu gostaria que fosse no caminho da igualdade e da livre escolha, principalmente para as mulheres!
Dra. Carla Lima, Socióloga, Coordenadora da Cruz Vermelha da Trofa
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