Jorge Pina, a Luta e a Corrida pelo o Amor
O Amor é tudo!
Jorge Pina, 44 anos foi um dos maiores pugilistas de Portugal. Descobriu esta paixão depois de ter passado vários anos a experimentar desportos como o rugby, o judo e o futebol, mas foi no boxe que encontrou a sua verdadeira paixão e um escape para as fases menos boas da vida.
Considera- se um Homem puro, verdadeiro, honesto e justo. Para ele o que mais importa é o Amor e a Paixão verdadeira.
Tem um espírito muito jovem e quer continuar a ser uma criança a vida toda.
Quem é o Jorge?
É uma pessoa simples, sensível e carinhosa, que pretende sempre respeitar as outras pessoas e fazer sempre o bem. Ajudar sempre os que mais precisam independentemente de quem são, com as suas diferenças e partilhar muito amor, alegria, carinho e esperança.
É romântico?
Sou uma pessoa normal, considero-me romântico.
Como foi a sua infância? Alguma vez se sentiu discriminado ou inferiorizado em relação à sua deficiência visual?
A minha infância foi normal, pois eu ceguei por volta dos 26/27 anos. Cresci num bairro social problemático, onde tive que encontrar caminhos que me tirassem da marginalidade. A cegueira apareceu muito depois, já eu era adulto.
Como foi o seu primeiro encontro amoroso, após a cegueira?
Foi um misto de sensações. Para mim o Amor é paixão que sem amor não existe nada, não há emoção, não há vontade, não há desejo, não há prazer. Tudo começou com uma entrega de sentimentos que foi muito mais além.
Como conheceu a sua companheira?
Conheci-a a correr. Não sei, se fui eu atrás dela ou ela atrás de mim. Depois de cegar comecei a fazer atletismo e ela costumava correr onde eu treinava. Convidei-a para o meu aniversário e pronto…! Aconteceu que a agarrei e beijei, e assim começou a nossa história de amor.
Como vê a sua companheira?
Eu vejo-a com os olhos do meu coração. A ligação à minha companheira é muito além da visão e toda a gente sabe que os olhos enganam.
Na minha opinião, as pessoas olham pela parte estética, mas a maior beleza do ser humano está no interior de cada um. Como dizia no livro o “Principezinho”, a beleza está no coração, está na alma, no espírito e naquilo que pensamos.
Alguma vez a sua companheira sofreu alguma crítica por estar consigo?
No princípio sim, existiu muito preconceito que para além de ser cego existia também a cor.
As pessoas questionavam-na. "E agora como é que é? Ele é cego, que vais fazer da tua vida? Ele vai ser sempre dependente de ti!"
Mais tarde, acabou todo esse preconceito e começou a paixão da própria família e das pessoas por mim porque se apercebem que eu sou uma pessoa totalmente diferente.
Sente-se um Homem inferiorizado em relação aos outros?
Nunca me senti inferior a ninguém, porque desde muito pequeno tive que ser um lutador. Pratiquei uma modalidade de combate, por isso, nunca deixei que esse preconceito ou esses pensamentos e o que os outros pensam me deixassem afetar. Tenho que ter a consciência de quem sou e sentir-me bem comigo mesmo.
Claro que tive de desenvolver um trabalho interior, sou um Homem de valores, gosto de desafios e de fazer as coisas certas.
Nunca me mostrei incapaz por ser cego e pelo facto de ter nascido num bairro social, não me faz diferente dos outros.
O olhar aproxima ou atrai?
Quando eu via gostava de falar mais com os olhos do que com a boca.
Hoje em dia falo mais com o silêncio, uso menos as palavras, digamos que foi uma nova adaptação à vida.
Como já não consigo perceber se as pessoas olham para mim ou não, tento olha-las com as minhas limitações.
Mas será que a visão é fundamental para uma vivência sexual saudável e satisfatória?
Não preciso de ver, preciso de sentir, desfrutar do prazer, quando o sexo é o Amor, mas para isso tem de existir Amor.
O Amor é quando nós amamos, desejamos dar prazer e satisfazer a ambos. Para isso, tem de existir sentimentos de ambas as partes.
Na vivência sexual os olhos não interessam, o mais importante é o Amor e o toque.
É preciso ver com os olhos para gostar de alguém?
Acho que o Amor não tem nada a ver com aquilo que nós vemos.
Hoje em dia, estamos habituados a um mundo que nos ensinou a ver tudo e a ter tudo com os olhos, porque a primeira visão é através dos olhos, mas depois de ver o interior, surge aquela surpresa, que não tem nada a ver com aquilo que pensamos.
Por isso, é que eu digo que os olhos enganam.
Não se pode ter o bom dos dois mundos, mas se nós usarmos o coração, sem visão, conseguimos ir pelo caminho que queremos, isso é bom!
A visão conduz a uma avaliação mais física e superficial do outro?
Há pessoas que não conseguem ver o interior do outro, para isso é necessário existir um sentimento à partida. A avaliação física por vezes é enganadora.
Neste sentido a visão leva-nos para uma ilusão e não para a verdadeira essência do outro. Concorda?
Concordo, porque a visão leva-nos à ilusão. Quando a pessoa vê pode ser levado a um mundo que não corresponde ao que vê, porque os olhos iludem. A verdadeira essência vem da partilha de experiências e sentimentos.
A sexualidade envolve a exploração dos nossos cinco sentidos. Será que a ausência de um desses sentidos aumenta a sensibilidade dos restantes e de certa maneira, torna o sexo ainda mais envolvente e satisfatório?
O sentido mais importante para mim é o da emoção, pois sem este sentido sensorial, não há sensações verdadeiras.
Se não existir carinho, amor, paixão, no casal o sexo não será envolvente e satisfatório.
Sinto que esta parte sentimental, e este conjunto de emoções torna a relação mais mágica em todos os sentidos.
Num sentido mais lacto, será que a cegueira impede mesmo a pessoa de "ver"?
A cegueira não impede de ver, a cegueira ajuda a ver melhor, a sentir e a perceber mais os outros.
A cegueira não dificulta, se calhar até nos trás transparência, uma melhor perceção das situações.
Considera que os preconceitos/ tabus na sociedade podem privar os cegos de uma vivência sexual plena e intensa?
Acho que não, depende de como cada um lida com a sua cegueira.
Quando nós conseguimos desligar do que os outros pensam e começarmos a aceitar as nossas condições físicas, percebemos que somos assim, podemos ser felizes.
Temos de nos focar mais no EU, na felicidade, no amor e na paixão para sermos completos.
Será que as pessoas com cegueira têm uma perceção positiva da sexualidade?
A cegueira não afeta, não influencia, o que pode influenciar é a falta de confiança em nós.
Existindo confiança em mim, aceitar como eu sou, ter a consciência tranquila, a cegueira não me afetará nada.
A nossa mente, a forma como nós cegos encaramos a sexualidade, a forma como vemos é tudo, pode ajudar ou prejudicar.
Que mensagem quer deixar a homens e pessoas na sua situação?
Homens e mulheres com algum tipo de cegueira acreditem em vocês, encontrem a verdadeira essência da vida, do amor para serem felizes.
Não se preocupem com aquilo que os outros pensam, o mais importante é sermos felizes e aceitarmos a vida tal como ela é.
Devemos procurar partilhar amor, esperança.
Aceitem a cegueira como a vossa condição de vida, o caminho é a aceitação, e renderem-se à vida e ganharem força para ser feliz.
Nunca se esqueçam que a felicidade não está no exterior e sim no interior, e Todos nós temos a capacidade de sermos felizes.
Jorge Pina, Associação Jorge Pina
Comments