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Explorar a Sexualidade em Crohn, sem representação, por Francisco Martinho






Francisco Martinho é um jovem de 32 anos, ator e portador da doença de Crohn, alentejano da zona de Portalegre, atualmente a residir em Cascais, por motivos profissionais. Filho de pais separados, com um irmão.

Desde muito jovem e por influência de uma série televisiva, sempre ambicionou ser ator de TV/teatro, o que na altura não aconteceu por oposição e receio da sua mãe, mas como Francisco é persistente, sempre disse que um dia ia conseguir ser esse ator. Volvidos todos estes anos, cerca de 15 a 20, Francisco teve uma grave crise da doença de Crohn, ficando completamente acamado, com cerca de 41kg. Perdeu a marcha por atrofia muscular, ficou incontinente, entre outros problemas, dependendo totalmente do cuidado de terceiros.

Chegou a um ponto em que os seus médicos afirmaram que já não haveria nada a fazer, dado ao estado avançado desta crise, mas Francisco, conhecedor da sua força, sempre soube que ia superar este desafio, que representava só mais uma das suas batalhas.

Foi com a sua força de vontade e persistência, que começa a recuperar e a dar os primeiros passos mesmo caindo no chão por vezes. Com a ajuda de tratamentos em meio hospitalar e com a alteração na alimentação tudo começou a melhorar. Passado cerca de 1 ano e meio, Francisco está praticamente recuperado e, para espanto de muitos, a doença entrou em remissão. Mal se sentiu com forças e com mais uma oportunidade de vida, Francisco foi atrás do seu sonho. Hoje já participou em novelas, já gravou publicidade, sendo que até foi protagonista em uma das campanhas publicitárias.

Atualmente, Francisco começa a sentir-se realizado, conheceu pessoas incríveis e está onde sempre ambicionou estar.

Nesta entrevista sem tabus ao Love With Pepper, Francisco abre o seu coração e aborda a sexualidade na doença de Crohn, sem qualquer vergonha e preconceito.


Como nasceu a sua paixão pela representação?

Na verdade, sempre fui o " humorista da família", sempre tive prazer em fazer rir os que estão à minha volta. Houve uma série televisiva que me deu certezas do que queria ser um dia. Frequentei ainda o curso de animação sociocultural e aí já vivi um pouco a experiência de atuação e tive a certeza do que amava fazer a nível profissional.




O que é Doença de Crohn?

A doença de Crohn é uma doença inflamatória intestinal. Inicialmente senti revolta e não sabia porquê logo a mim, pois nunca fumei, nem fui de beber muito, como era normal nos jovens da minha idade. Mais tarde, comecei a saber lidar com a doença e conheci várias pessoas como a Sara, uma portadora de outra DII, e foi muito reconfortante saber que não estou sozinho nisto. Hoje olho para a doença como a minha força para prosseguir o meu caminho. Pois também sou um ponto de referência para outras pessoas com DII e parece que sinto essa responsabilidade de ter que ser o exemplo: isso acaba por me dar força. O momento muito difícil que passei com a doença é que me fez crescer como pessoa em muitos sentidos, dar valor a outras coisas e também correr atrás do meu sonho da representação. Portanto, resumindo, a doença para mim era algo negativo da minha vida, mas que eu consegui dar a volta por cima e para além de aceitar a doença ainda a uso para progredir.


Como é ser doente crónico em Portugal?

Não é nada fácil, pois o nosso sistema de saúde não está devidamente preparado para certos tipos de doença tal como as DII, não temos WC adequados, por vezes a alimentação hospital também não é a certa para nós. Não temos acesso, nem apoios a certeza coisas, como uma alimentação entérica, que tive de fazer quando já não suportava alimentação normal e são de um custo muito elevado. Na altura, era cerca de 35€ cada lata desse pó alimentar e eu fazia uma por dia, mas o objetivo era 3 por dia e era impossível para mim suportar essa despesa diária. No início, ainda consegui, mas depois o que me valeu foi a união de outros doentes de Crohn que me ofereceram latas. Portanto acho que o SNS tem que sofrer muitas alterações para melhor conforto e atendimento de utentes.


De que forma é que a medicação e o tratamento desta doença lhe afetam a vida sexual?

A medicação que faço atualmente não tem qualquer indicação que afete a vida sexual, mas já fiz uma medicação que não me permite ter filhos e, na altura de o médico me propor a medicação, eu tive que assinar documentos em como tomei conhecimento dos efeitos secundários da mesma. Mas até hoje nunca senti que me afetasse em nada na minha vida sexual.


Que sintomas interferem na sua intimidade?

Até hoje nunca tive sintomas que interfiram na minha intimidade.


Sente que esta doença lhe afetou a sua masculinidade ou virilidade?

Agora acho não, embora sempre pense nisso. Houve alturas em que achava que nenhuma mulher me iria querer, ou como lhe iria contar que tenho este problema de saúde, como vou arranjar alguém que me aceite assim, ter que fazer tratamentos, consultas, enfim tudo o que está envolvido. Mas hoje cresci como pessoa e sei que quem ama, ama de qualquer maneira independente das nossas condições físicas ou psicológicas.


A doença tem algum impacto na sua autoestima, a confiança e a intimidade em relação à sexualidade?

Esta pergunta vai um pouco ao encontro da resposta dada à pergunta anterior, o medo por vezes falou mais alto, mas quando ficas bem resolvido com as coisas, tudo passa.


Alguma vez rejeitou ter relações sexuais devido aos sintomas desta doença?

Não, nunca.


Sente dor ou desconforto no ato sexual? Se sim, como lida com essa situação?

Também nunca senti nada, nem dor, nem desconforto, apesar de a médica por vezes me questionar, mas eu nunca tive qualquer sintoma a esse ponto.


Que desafios e obstáculos esta doença lhe trouxe no campo sexual?

Cheguei a um ponto que optei por parar a minha vida sexual. Eu já era muito reservado nesse sentido e com as limitações que a doença me deu, eu optei por parar um tempo além de que nem era comprometido na altura e também foi mais fácil.


Que ajustes e adaptação teve que fazer na sua sexualidade devido a esta doença?

Como parei a atividade nessa crise, não tive de fazer qualquer ajuste ou alteração e hoje estou completamente normal.

 

De que forma a ansiedade e o stress desta doença lhe afetou a sua saúde sexual?

Não noto que me tenha afetado em nada.


Como é que vê e lida com o seu corpo?

Como perdi muito peso, tinha muita vergonha do meu corpo, até numa simples ida à praia ou piscina eu tentava aguentar ao máximo uma t-shirt vestida. Hoje, como já consegui recuperar 34 kg estou muito confortável, embora ainda não tenha o corpo ideal. Para mim, já estou muito confortável, sendo que agora é trabalhar no ginásio arduamente para conseguir os objetivos.


É possível ter uma vida sexual prazerosa e satisfatória com esta doença?

Sim, desde que não esteja em crise, somos pessoas completamente normais e

saudáveis.


Num relacionamento como se fala sobre a doença e a sexualidade?

De início é complicado, sem saber como revelar que temos uma doença intestinal, mas depois tudo é normal e faz parte da nossa rotina. Da mesma forma, por exemplo, que digo que vou ao supermercado também digo que vou ao hospital fazer medicação.


Sente-se um homem seguro a nível sexual?

Ainda tenho que aumentar mais a minha confiança, mas sinto que estou a melhorar nesse sentido.


Alguma vez procurou ajuda na terapêutica para lidar com questões emocionais e questões sobre sexualidade relacionadas com esta doença?

Não, eu nunca aceitei esse tipo de ajudas. Embora eu aconselhe para outras pessoas.


Considera que o nosso SNS e os profissionais de saúde estão preparados para lidar com este tipo de doenças e abordar a sexualidade com estes?

Acho que não, aliás muitos profissionais de saúde não têm conhecimento sobre a doença de Crohn. Logo nunca poderiam ajudar nesse ou em outro sentido.


Sexualmente realizado. Vida feliz. É o lema do Love with Pepper, concorda?

Sim, não conhecia o projeto. Mas pelo que ja consegui ver em entrevistas acho que sim.


Apesar de todas as adversidades o sexo é bom?

Sim, é muito bom. Aliás, quem não gosta? (risos)


Francisco Martinho, Ator

 

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