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Amar Sem #Ouvir, por Alexandra Reis

Atualizado: 29 de nov.


 

 Alexandra Reis, licenciada em Língua Gestual Portuguesa, vive no Funchal na Ilha da Madeira. É uma mulher surda. Casada com um homem surdo, em que deste amor nasceu um filho surdo.

 

Considera-se uma mulher protetora, sensível, amorosa, defensora, aconselhadora, preocupada, amiga do amigo e pensa sempre primeiro nos outros.

Assume-se romântica e um pouco ciumenta e quando vê que certas situações não lhe agradam em relação ao seu marido, manifesta-se, referindo que é bom ter a sempre um bocadinho de ciúme, porque é um sinal que existe AMOR e preocupação. 

 

Adora animais, e ama a sua cadela Ema, não deixando de referir que aprecia viajar e conhecer outras culturas para ter outra perspetiva da vida.  Agradece a que Deus tudo o que deu ao mundo.


Conheceu o seu marido num no convívio dos surdos no instituto de surdos do Funchal em setembro de 2006. Namoram durante 5 anos, casaram e ainda hoje, depois de 18 anos ainda continuam juntos.


Nesta entrevista ao Love with Pepper, Alexandra abre o seu coração, sobre as adversidades que a surdez lhe pôs à prova e que nunca devemos desistir dos nossos sonhos e que devemos acreditar em nós

 

 Para si o que é a surdez?

A surdez para mim é normal, e apesar de ter crescido utilizando aparelhos auditivos, sempre que chego a casa, tiro-os e aproveito o silêncio. Isto porque, no final do dia, o desgaste do esforço auditivo que envolve a minha interação com a sociedade maioritariamente ouvinte, leva-me a procurar esse conforto.

 

Quais os tipos de comunicação existem para um surdo?

As pessoas surdas, assim como em qualquer outro cidadão, são todas diferentes, e por isso, com características próprias e backgrounds diferentes. Existem pessoas surdas que têm como Língua Materna a Língua Gestual Portuguesa, e por isso essa é a forma de comunicação mais eficaz e natural, por outro lado podemos ter cidadãos surdos, que utilização maioritariamente a língua portuguesa usando a oralidade e dando preferência à leitura labial ou à escrita. Ainda existem pessoas surdas, normalmente mais velhas, que não tiveram acesso à Língua Gestual Portuguesa que comunicam através da mímica ou gestos regionais. Independentemente de qual for a situação em que o ouvinte se depare com um cidadão surdo, o que deve tentar perceber o que é mais confortável para aquele indivíduo para comunicar, seja através da leitura labial, da língua gestual portuguesa, mimica ou da escrita.

 

Porquê que existem surdos que oralizam e surdos que utilizam apenas a Língua Gestual?

Seja qual for o grau de surdez, que pode ser ligeiro, moderado, severo ou profundo, e podendo a pessoa usar aparelho auditivo ou ser implantado, ou não usar nem uma coisa nem outra, o surdo que utiliza a oralidade e o surdo que utiliza a Língua Gestual Portuguesa têm apenas uma diferença, a Língua em que comunicam.

 

Considera que o som é importante no ato sexual?

Para mim não, pois através do toque e o olhar conseguimos aquilo que, para mim, é mais importante no ato sexual.


Quais são os maiores obstáculos da surdez?

Não há obstáculos na surdez quando as duas pessoas são surdas, como é o meu caso, mas se uma pessoa for surda e outra ouvinte, podem surgir obstáculos a nível de

comunicação, devendo estar frente a frente para poder haver uma boa comunicação.

Será que os surdos têm uma perceção positiva da sexualidade?

Sim, acho que sim, assim como acontece com as pessoas ouvintes.

 

Como é que a surdez interfere na sua relação com os outros?

Interfere na questão da comunicação, porque há ouvintes que não sabem a LGP e muitos outros que nem fazem o esforço de comunicar lentamente. Na altura da pandemia, com o uso das máscaras, tornou-se numa barreira enorme, em que me sentia aprisionada e sem interação com as pessoas ouvintes, até porque muitas delas nem faziam o esforço de escrever num papel para podermos comunicar.

 

Normalmente, convivo com pessoas ouvintes e surdos que sabem LGP, mas também consigo conversar em língua portuguesa, quando há sensibilidade para falar devagar conseguir acompanhar a conversa.

Relativamente a me sentir discriminada, sim, sentimos várias vezes discriminação por não haver compreensão e empatia.  Tentamos não valorizar muito isso, uma vez que normalmente acontece por serem pessoas ignorantes e malformadas. Mas, claro que por vezes, sinto-me mal com isso. Ainda assim, tenho plena consciência de que somos todos iguais e diferentes ao mesmo tempo e lá no fundo haver respeito e empatia por todos.


Relativamente às relações amorosas, considera que a surdez pode ser um obstáculo?

Não, a surdez não é um obstáculo, é apenas uma adaptação de uma língua.

 

Será verdade que uma deficiência de um dos nossos sentidos poderá levar a uma maior sensibilidade dos restantes sentidos (visão, olfato, tato…)?

Sim, como não ouvimos temos um campo de visão mais alargado, e conseguimos percecionar o estado emocional de quem nos rodeia com maior facilidade do que os ouvintes, que, e devido aos estímulos sonoros, não dão a devida atenção a determinados pormenores. Também conseguimos ter uma concentração mais duradoura, pois não existe nenhuma distração auditiva.

 

No ato sexual, a surdez pode esmorecer o nível de excitação? Pode explicar como?

Não, apesar de não ouvirmos, temos a energia que é transmitida pelo olhar, pelo toque, pela química e pela emoção que surge quando os corpos se juntam e aí tudo aparece. Até porque para nós surdos estamos em vantagem perante os ouvintes, uma vez que não há barulhos que atrapalhem o momento. (risos)


O que falta fazer pela comunidade surda no nosso país?

O mais premente e importante para a Comunidade Surda em Portugal é oficializar a língua gestual portuguesa, como a língua oficial do País, porque que através dessa oficialização possam ser resolvidos vários problemas na educação.




 Que mensagem gostaria de transmitir às pessoas surdas?

Nós pessoas surdas devemos ter orgulho de quem somos e da nossa Língua Gestual Portuguesa. A surdez, embora possa ser um obstáculo, tem tido o nosso compromisso na luta da causa dos surdos, na tentativa de alcançar tudo aquilo que temos direito, e faremos tudo que está ao nosso alcance para serem criadas as adaptações necessárias para termos o sucesso na vida como merecemos.


O Amor vence o preconceito?

Claro que sim, mas vai levar tempo para quebrar todos os preconceitos, pois infelizmente há muitas pessoas ignorantes sobre o que é o respeito para com o próximo.

 

Alexandra Reis, Licenciada em Linguagem Gestual


 

 


 

 

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